A praia agitou-se de pessoas que, aos poucos, chegavam. Sem qualquer timidez, colocavam os calções e os de fatos de banho a dar os bons dias ao sol.

Na água, uma menina flutuava num cavalo marinho insuflável, quase adormecida. Um rapaz procurava dar vida a um papagaio de papel, chamando o pai em seu auxílio de todas as vezes que não conseguia. Jovens metiam conversa com a bola. Um dos mais pequenos guardava na boca o refresco como um elefante. Talvez a mais perspicaz das crianças fazia snorkeling, tentando encontrar o segredo mais bem guardado do fundo do mar.

Peixes miudinhos corriam maratonas dentro das poças, escapando às investidas dos pés dos humanos. As conchas Anacleta e Leonilde e a alga Deolinda falavam ainda mais baixinho, na expetativa de não serem apanhadas.

– Será uma sorte não nos levarem…

– Tem calma, acredito que não seremos incomodadas. Estão tão entretidos com a tralha que trouxeram para a praia…

– Pois, mas não te esqueças que dessa tralha fazem parte os baldes e os camaroeiros onde nos costumam colocar. Não tarda nada estão a fazer castelos de areia com as pás e os ancinhos e precisam de nós para as decorações.

– E daí… levam-nos daqui para outro lugar. Conhecemos novas amigas.

– Eu não quero conhecer mais ninguém, às vezes prefiro ficar sozinha…

– Esquecia-me que passas a vidinha dentro da concha!

– Não dês nas vistas, sua espalhafatosa!

– Que exagero.

– É exagero é… e se nos levarem daqui para casa?

– Aconteceu a algumas das nossas.

– Achas que sobreviveremos?

– Evidente.

– Sim, mas teremos tantas saudades…

A mãe do mergulhador gritou:

– Cristóvão, sai da água!

Com a cabeça debaixo de água, a criança não obedeceu, certamente por não ter ouvido. Não é que as crianças obedeçam à primeira, mesmo que ouçam os pais…

A mãe retirou a saia de praia, colocando os pés e o corpo na água, indo ao seu encontro.

Cristóvão interrompeu os trabalhos de investigação marítima, retirando os óculos gigantes dos olhos e mantendo-os na cabeça.

A mãe riu-se, exclamando:

– Pareces um cientista maluco!

– Mamã, não quero sair…

– Tens de sair, estás a ficar roxo. As pontas dos dedos enrugadas.

Com a cabeça de fora, o miúdo começou a tiritar.

– Vês?

– Dentro da água não tremia desta forma.

– Vá, não sejas teimoso e faz o que te digo.

– Está bem, vamos.

Cristóvão enxugou o corpo à toalha, criando uma cápsula para o cabelo, protegendo igualmente os ouvidos. Deitou-se depois na toalha, juntando as mãos e dispondo-as atrás da nuca como uma almofada. Fechou os olhos e relaxou de forma momentânea. Levantou-se e disse:

– Vou brincar!

A mãe consentiu, deixando por momentos de ler, verificando onde iria. O menino sentou-se na areia com o balde e a pá, iniciando a construção de uma pista com estradas e pontes. Dali, seguiu até ao mar, enchendo o balde que levava, molhando depois a areia para a tornar mais rígida.

Antes de terminar a empreitada, procurou os mais belos vestígios trazidos pelo mar e deixados ao acaso na areia. Com a pá, apanhou as conchas Anacleta e Leonilde, levando-as a passear. Sentou-se, de seguida, com as pernas cruzadas e tirou a Leonilde, espetando-a na estrada em areia. Mais sozinha do que nunca, Anacleta permaneceu durante um longo período no fundo do balde azul de plástico, salgando-se na água parada.

A mãe atentou na nova brincadeira do filho, reclamando:

– Cristóvão, queres parar com isso?

O miúdo lambia a concha, com um enorme contentamento, repetindo o gesto, levando-a de novo ao balde para colher água.

– Que bom, mamã! O mar tem sal como as batatas fritas…

– Não exageres… O sal em excesso nem sequer faz bem.

– Faz, faz… – continuando o feito.

– Mandei-te obedecer, Cristóvão. Nunca fazes o que eu digo à primeira… A água pode estar estragada…

– Vá, está bem… – mostrou-se impaciente, criando logo depois uma nova brincadeira.

– Por favor, Cristóvão, o que fazes agora? Daqui a nada vamos embora, estou a ficar sem paciência.

A criança soprava para dentro da concha e depois colocava-a junto ao ouvido como um auscultador para ouvir música:

– Mamã, é tão bonita esta conchinha. Posso levá-la comigo?

O pai, que adorava bronzear-se, reagiu, acordando da sesta:

– Cristóvão, importas-te de fazer o que a mãe diz?

– Papá, eu não faço nada de mal…. Só quero prender esta concha mesmo, mas mesmo bonita, ao meu fio.

– A concha é enorme. Vai rebentar o fio…

– Não vai nada, papá, acredita. Para que queres magoar os meus sentimentos?

A mãe riu-se com a sensibilidade do filho, questionando:

– Vá… E para que queres levar a concha presa ao fio?

– Que pergunta… Quando estiver em casa, continuarei a ouvir o mar no meu coração.